quarta-feira, 12 de setembro de 2012

O CASAMENTO DO GRANDE MÁGICO MAYCON ESTALLONE e O FANTÁSTICO CIRCO-TEATRO DE UM HOMEM SÓ

Muitos costumam deliberar que o teatro brasileiro teve seu real início no começo do século XX, com o surgimento dos primeiros grandes dramaturgos tupiniquins. Pode ser uma verdade para a instituição teatral como é compreendida; todavia, muitos desconsideram que no início do império e até mesmo no período colonial, nosso país teve uma rica tradição artística que trazia a técnica teatral em seu repertório, além de abranger diversas artes. Estamos falando do circo.

Sim, o circo no Brasil tem sua origem há muito tempo, segundo o professor Zé Carlos de Andrade, em sua tese de mestrado em Artes Cênicas pela Universidade de São Paulo, ciganos de diversas nacionalidades já circulavam por aqui fazendo suas pantomimas, números musicais e encenações. No século XIX, famílias já tradicionais do cenário circense europeu também migraram em busca de novos públicos e se disseminaram por todo o país.





Segundo a matéria de Geraldo Hasse para o Sul21 (http://sul21.com.br/jornal/2012/01/primo-pobre-das-artes-o-circo-respira/), poucos de nós sabemos que em Porto Alegre o espaço que hoje chamamos de Praça XV foi terreno para o Circo Universal, circo fixo montado em madeira, que teve apresentações periódicas por três anos antes de ser destruído pela Prefeitura.

Para os amantes do teatro contemporâneo e seu experimentalismo, é bastante instigante descobrir que em meados de 1900, no RJ, o Circo Emílio Fernandes montou uma peça em que o Teatro São Pedro de Alcântara (atual João Caetano) era completamente inundado e que os atores representavam embaixo d’água e sobre pontes construídas especialmente para o espetáculo, conforme a professora Erminia Silva, autora do livro"Circo-teatro: Benjamim de Oliveira e a teatralidade circense no Brasil".

Se os dias atuais não tem sido animadores para o fortalecimento da indústria circense, obrigando os artistas a se adaptarem ao "circo novo" e suas exigências mercadológicas, a alma do artista circense continua intacta. A pureza de seu talento e a alegria que sempre contagiou as platéias, independente das circunstâncias, evoca os princípios mais nobres do ofício artístico. Para o circense, parece não haver situação ruim: dois já é público, dez é multidão. E a satisfação das platéias é tão plena que é como se realmente, houvesse estado ali, uma multidão.

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O 19° Poa em Cena nos presenteia com dois espetáculos gaúchos que se fundamentam no universo do circo em suas concepções, falando, principalmente, sobre a alma dos artistas. Ambos tem produções muito cuidadosas, com detalhes bem resolvidos em todos os elementos visuais. Concorrem ao Prêmio Braskem 2012.


O Casamento do Grandre Mágico Maycon Estallone parece se utilizar de uma história, quase um folclore, e investe em uma imersão pelo interior das antigas lonas dos pequenos circos que percorriam os quatro cantos dos continentes. Famílias de artistas não tão bons, com números piores ainda, mas dedicados ao seu único ofício - talvez por que não serviam para mais nada. A dramaturgia se apropria daquilo que não pode ser bem executado e o resultado é o envolvimento imediato da platéia com o objetivo do enredo.

Os arquétipos típicos do ambiente circense são amplamente utilizados, e os cenários e figurinos nos convidam a ingressar em outro ambiente, algo, deveras, remoto em nossas lembranças. Todos os atores tocam instrumentos, bem ou mal (sempre propositadamente). Faz parte da brincadeira explorar o que não dá certo.
 
A realização do Circo Girassol tira proveito daquilo que é mais singelo e puro dos picadeiros para construir uma produção focada em quem tem a alma do circo na sua essência e se emociona vendo pessoas unidas nos antigos clãs, preservando um conhecimento milenar de nossa humanidade.

Ficha Técnica:
Elenco: Tuta Camargo, Hálida Maria, Débora Rodrigues, Dilmar Messias, Diego Steffani, Álvaro RosaCosta, Andréa Farias, Vinicius Petry, Mariana Velhinho, Jéferson Rachewski / Trilha sonora: Arthur de Faria / Preparação musical: Simone Rasslan / Professores: Alex Prinz Anjinho (trompete, trombone, tuba, bombardino), Fabio Stone (clarinete, sax), Josemir Valverde (violoncelo) / Figurino: Daniel Lion / Cenário: Felipe Helfer / Iluminação: Fernando Ochôa / Adereços: Diego Steffani / Planejamento gráfico: Frederico Messias / Ilustração: Fábio Zimbres / Produção: Circo Teatro Girassol / Duração: 75min / Recomendação etária: Livre  
 

Se O Casamento de Maycon embarca em um universo coletivo, O Fantástico Circo-Teatro de um Homem Só, como o próprio nome diz, fala de um artista só. Mas que pode ser vários, a hora que quiser, e por isso representa todos.  Todos aqueles que conhecem e respeitam suas origens dentro de suas trajetórias.

O espetáculo mescla a biografia do multiartista Heinz Limaverde com elementos ficcionais, ao melhor estilo "Big Fish". Heinz surgiu do universo circense, e o espetáculo explora esse ambiente em diversos signos, transformando o palco em um pequeno circo-teatro.

A obra dá prosseguimento à pesquisa da Cia. Rústica que investe na temática do "show" na construção de sua linguagem e, no campo da dramaturgia, se utiliza relatos pessoais do atores. É pouco mais de uma hora embarcado nas correntes de um mundo que parece não mais existir, feito de fragmentos de memórias individuais ou coletivas.

Delicado e bruto, O Fantástico Circo-Teatro de um Homem Só estará em cartaz no dia 22, mais uma opção local dentro da grade do festival.

Ficha técnica:
Direção: Patricia Fagundes / Iluminação: Lucca Simas / Autor: Heinz Limaverde e Patricia Fagundes / Elenco: Heinz Limaverde / Trilha sonora: Simone Rasslan / Cenografia: Juliano Rossi / Figurinos: Daniel Lion / Adereços, cores da cenografia e programação visual: Paloma Hernandez  / Produção executiva: Priscilla Colombi / Duração: 65 minutos
  

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