sexta-feira, 7 de setembro de 2012

OS PLAGIÁRIOS



 

1942
"O Sr. Nelson Rodrigues deixou-se levar por seus ótimos dons literários. Compôs uma obra de mérito, sem dúvida. Mas não faz teatro."
Crítica a "Mulher sem Pecado", assinada apenas por IINT, no "Diário de Notícias"
1944
"Essa peça não passou de esboço... Constitui ainda mais uma procura de caminho do que uma realização plena."
Crítica a "Vestido de Noiva", de Lopes Gonçalves, no "Correio da Manhã"
1958
"Nelson Rodrigues, que há 15 anos surgiu como autor e parecia ser o renovador da dramaturgia brasileira, orientou-se depois pelo caminho barato que todos sabem, fazendo o pior uso de suas qualidades. (...) 'Os Sete Gatinhos', que se enquadra na linha de suas novas tendências (...) é a pior de todas. Não acreditamos que o autor de 'Vestido de Noiva' escrevesse aquilo a sério. Por isso recusamo-nos também a levá-lo a sério, acrescentando apenas que o espetáculo é tão ruim como o texto e lamentando que o dramaturgo, de quem tanto se esperava para a renovação de nosso teatro, preferisse concorrer dessa maneira para a sua desmoralização."
Crítica a "Os Sete Gatinhos", de Henrique Oscar, no "Diário de Notícias"
1961
"Não estou tentando complicar as coisas. Nelson Rodrigues é complicado por si próprio. Nunca foi entendido por diretores e críticos. Entre os últimos eu me incluo. Só agora começo a enxergar com clareza sua obra. Já escrevi muita besteira sobre ela, pró e contra."
Crítica a "Boca de Ouro", de Paulo Francis, no "Última Hora"
1962
"A nova peça de Nelson Rodrigues, 'Otto Lara Resende ou Bonitinha mas Ordinária' (...) dá-nos a impressão de que o autor regrediu como dramaturgo, pela volta à forma de suas obras menos felizes, como 'Perdoa-me por Me Traíres' ou 'Os Sete Gatinhos'. (...) Falta ao texto intensidade dramática, a força teatral, aquela qualidade que fez de Nelson Rodrigues um dramaturgo que pode ser discutido em suas ideias ou temas mas que em geral se afirma como um autor teatral autêntico. (...) Muito grave é que Nelson Rodrigues (...) deixe-se agora influenciar pelo cronista, a pior coisa que pode acontecer a um dramaturgo."
Crítica a "Bonitinha mas Ordinária", de Henrique Oscar, no "Diário de Notícias"
1968
"Não encontro, por mais que procure, qualquer razão de ser para se remontar, na época que atravessamos, 'Viúva porém Honesta'. Quando a peça foi criada, há cerca de 15 anos, ela podia a rigor contribuir para afirmar na opinião pública a imagem que Nelson Rodrigues havia então criado a si mesmo: a de um desbravador, de um derrubador de tabus (...). A peça não passa de brincadeira, inconsequente e boba..."
Crítica a "Viúva porém Honesta", de Yan Michalski, no "Jornal do Brasil"
2002
"A originalidade de Nelson está justamente numa realidade dramática impossível de ser contida pela dramaturgia psicológica. (...) Os personagens pertencem a um universo de signos inquietantes de mundos interiores com a fatalidade da desilusão."
Crítica a "Toda Nudez Será Castigada", de Macksen Luiz, no "Jornal do Brasil"
2005
"Nelson Rodrigues subverte os meios narrativos para quebrar com a linearidade e encontrar, na inversão de tempo, o substrato da tensão de um gesto definitivo".
Crítica a "Toda Nudez Será Castigada", de Macksen Luiz, no "Jornal do Brasil"



Diones Camargo não desiste nunca. É um resistente.Contraria diariamente a máxima brasileira de que dramaturgo bom é dramaturgo morto (ou quase). Por vezes quis ser ruim e continuar vivendo, mas tem muito talento pra conseguir fazer isso. Outras vezes, quase morreu, mas como quase todo dramaturgo, algum amigo o salvou na hora H. Para Diones, hoje, só há duas saídas: ou viaja para outro país, onde será venerado, ganhará muito dinheiro, terá os holofotes ao seus pés com tapetes vermelhos e orgias oníricas, ou então continua aqui, no RS, trabalhando como um porco para ganhar a ração do mês e seguir a vida provinciana que o cotidiano obriga a todos nós.

"Nelson Rodrigues era um visionário, louco, pervertido, um verdadeiro inimigo da ordem e dos bons costumes, da manutenção das boas maneiras e práticas sociais, um deturpador da imagem da aristocracia."

Mas muito poucos lembram que é também um ator, e um grande ator! Diones deu o golpe: fingiu quase morrer. Assim poderia ter um pouco da fama em vida, que lhe seria entregue totalmente na posteridade. Enganou médicos, farmacêuticos, cirurgiões; seu caso era quase perdido. Quando já não se sabia mais o que fazer, o sucesso começou a visitá-lo diariamente. Vinha todos os dias, sempre de um jeito diferente, travestido com mil cabelos, jaquetas, livros, quindins, vestidos e sorrisos. A fama se apiedara de Diones, virou sua querida e já estava se tornando sua amiga confidente. Há, quantos pesares... Oh, quantos clamores e segredos... Então o moleque levantou-se do quarto de enfermo, riu da cara de todo mundo e se apoderou de toda a atenção que o tempo lhe permitisse dar, pois quem quase morre, quase vive, e texto bom é de quem está quase lá.







"Até 1935, quando a situação começou a melhorar, os Rodrigues experimentaram a miséria. Em trecho das 'Memórias', Nelson escreve: 'eu e toda minha família conhecemos uma miséria que só tem equivalente nos retirantes de Portinari'. O saldo do período foram as duas tuberculoses de Nelson, que chegou a ser internado, e a morte de Joffre, aos 21 anos, também devido à tuberculose. Joffre era o irmão mais próximo de Nelson, ele dizia que era como se os dois fossem gêmeos."
 


Diones hoje já prepara em segredo sua próxima artimanha. O tempo está passando, o festival também, e todo mundo vai esquecê-lo, como já o esqueceu outras vezes. A fama não o esquecerá, é duro ser enganada, mas ela é amiga de muita gente, e muita gente gosta de tê-la ao lado. Diones não tem muita paciência para ter alguém muito tempo ao lado. Porém, de alguma forma, existe uma sublime e estranha gratidão por tudo, que antes não existia. Esse é o preço de ser tão esperto.  Mas com certeza, ninguém vai esquecer que Diones não é só um bom dramaturgo que não desiste, mas um cara que sabe que a vida dá voltas, e que a fama pode voltar. É só dar a ela o que ela quer, maquinar uns truques ali e aqui, e assim se pode desafiar um pouco mais o destino.



"A grande tragédia do teatro é depender do público. O dramaturgo, no entanto, só realiza sua obra na medida em que se liberta do público. O romancista e o poeta levam, por isso, grande vantagem sobre o autor teatral. Essa, é a minha convicção inabalável." Nelson Rodrigues em entrevista para Folha de São Paulo.


Os Plagiários é a mais nova obra do dramaturgo Diones Camargo, e esteve hoje em seu último dia no Festival. As seções esgotaram. É um trabalho único e um ponto de referência na história da criaçao cênica gaúcha. Além disso, é o último espetáculo produzido integralmente no Centro Cenotécnico do RS, que agora espera lentamente o dia em que será demolido por causa da Copa do Mundo. Reúne quatro grandes companhias de teatro do RS - Santa Estação, Falus e Stercus, Caixa de Elefante e Sarcáustico (as premiadas no Prêmio Braskem 2011) e é um marco onde se deve comemorar a comunhão de idéias, esforços e talentos para a produção de algo exclusivo e memorável dentro da trajetória artística do nosso estado. Talvez o fim de um ciclo de caranguejos... Conta com atores experientes e jovens artistas, e tem a direção de Jezebel de Carli, Guadalupe Casal, Mario de Balenti e Marcelo Restori. Comemora o centenário de Nelson Rodrigues.  É uma iniciativa que deveria ter (e todos que assistiram torcem), ainda, um belo caminho a percorrer.



Ficha técnica:

Direção: Guadalupe Casal, Jezebel De Carli, Mário de Balenti e Marcelo Restori / Texto: Diones Camargo / Coreografia: Larissa Sanguiné / Colaboração cênica: Carolina Garcia / Elenco: Alice Maria Paiva, Ana Luiza Bergmann, Anna Júlia Amaral, Bia Noy, Carla Cassapo, Cris Bocchi, Camila Vergara, Carol Martins, Elison Couto, Filippi Mazutti, Fredericco Restori, Frederico Vittola, Gabriela Greco, Jaime Ratinecas, Lívia Perrone, Manuela Albrecht, Nátali Caterina Karro, Pedro Nambuco, Roberta Alfaya, Raissa PanatieriI, Rafael Becker, Thaiane Estauber, Viviana Schames e Valquiria Cardoso / Figurino: Daniel Lion / Trilha sonora: Arthur De Faria / Preparação de voz: Francis Padilha / Iluminação: Daniel Fetter e Fabricio Simões / Técnico de Som: Zé Derly / Fotos : Regina Peduzzi Prostskof / Produção Executiva: Luana Pasquimell / Realização: Porto Alegre em Cena / Duração: __min / Recomendação Etária: 12 anos
 

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